sábado, 19 de maio de 2012

o melhor ainda está por vir



Com uma voz de início de trovão, Geraldo Roca é tão comedido e receptivo que, pela primeira vez, fiz relação entre essa figura e os títulos de seus discos. O contraste entre a apresentação física do artista (tom grave, forte, vibrante, colossal) e sua gentileza e cordialidade soa como um paradoxo, assim como Música do Litoral Central e Veneno Light. Mas essa maneira prudente de se comportar resume-se à comunicação em si, porque o conteúdo de sua conversa revela um homem extremamente inquieto com o mundo ao seu redor.

Diferentemente dos músicos de sua geração, o viajante, carioca por nascimento e sul-mato-grossense por amor, não canta as ararinhas e jacarés do Pantanal. Roca gosta mesmo é de falar de loucos e solitários, de economia, religião, do mundo, quase sempre com doses nada homeopáticas de ironia e acidez. Suas músicas apresentam histórias de ambientes e das pessoas que os compõe. Ele faz questão de manter uma tal de distância poética de sua obra. “Eu não estou aqui para falar dos meus sentimentos. O artista tem que enxergar de maneira diferente aquilo que se passa diante dos seus olhos”. O verdadeiro anti-astro!

Filho de fazendeiros, Roca cresceu ouvindo chamamé, “aquele do estilo do Benites mesmo”, mas nem de longe o ritmo influenciou sua música. Começou sua carreira com o bom e velho rock’n’roll e logo se desligou de sua banda. “O negócio começou a ficar muito progressivo, chato pra caralho”, foi a explicação de quem veio ao mundo para incomodar, apesar de hoje estar conformado com o fato de que sua geração  teve a faca e o queijo na mão mas, ao invés de botar a goiabada, deu o queijo aos ratos.

Não adianta esperar pontos finais desse cara mais louco do que a média. Ele concorda que os Prata da Casa foram uma tentativa de estabelecer uma identidade cultural para o estado recém-nascido (como se Os Pioneiros nunca tivessem existido?), mas é bastante reticente quando fala em cultura e identidade. “Eu não vejo possibilidade de definir a cultura sul-mato-grossense, como a gaúcha, por exemplo, em que você coloca uma bombacha no cara e fala que aquilo é a cultura gaúcha. A cultura é uma coisa viva, como a própria identidade, está em processo, sempre em construção. Especificamente aqui no Mato Grosso do Sul, acredito que o melhor ainda está por vir”.

Avesso a conversas muito longas, Roca não quer desperdiçar tempo. Tem apenas 8 meses a mulher que o prende em casa, Beatriz. “Ela é a coisa mais linda do mundo, eu rasteeeeejo ao berço dela”. Mas antes de se despedir e ir se dedicar à filha, Geraldo suspira, como um amante que não teve sua paixão correspondida: o cenário era o do movimento Punk, daquela galera no future, e ainda assim sua trupe mantinha o positivismo. Os Velhos Amigos tinham altas aspirações com relação a tudo que acontecia no mundo, era mesmo uma geração utópica. Porém, segundo ele, uma estaca foi fincada em determinado momento. “E outras ainda serão”. Atualmente um pouco sem paciência para a música, o cara com tempestade na voz deve ter três décadas de motivos. “A gente teve que se conformar com outra coisa. A verdade é que nossas aspirações viraram nada...”.

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