segunda-feira, 13 de agosto de 2012

como eu me sinto quando... vejo Frágil ou o sentido da ruptura


A vida acontece em qualquer lugar. Até no palco.

Pode ser que as coisas estejam acontecendo em outro lugar, e não onde eu estou. Em qualquer aldeia.
Que Mato Grosso do Sul é um estado com vasta mistura cultural não é novidade. E você há de concordar que há sempre uma tentativa quase consensual em folclorizar a figura do índio. Então você coloca uma pena de papel na cabeça da criança, faz dois risquinhos de tinta guache em cada bochecha e comemora o 19 de abril. Ou diz no jornal que os guarani-kaiowá são baderneiros e suicidas. Alguém tem feito isso com esmero e dedicação e, como um vírus dos mais insistentes, tem se propagado nas redações dos periódicos e sendo quase que vulgarizado no facebook e adjacências.
Então você o vê assim como eu, na aldeia Bororó. Índios cheios de planos, com medo, sorridentes, irônicos, nostálgicos. Humanos. Então o Edson Clair nos presenteia com “Frágil ou o sentido da ruptura”. De repente apresenta-se uma verdade implícita em cada movimento, cada música e cada silêncio desse espetáculo sensível, com clichês, mas também com a maturidade da desilusão.
Se o Funk-se queria falar sobre mergulhos em abismos, então escolheu uma temática certa. Não veio só para falar de alcoolismo e suicídio em sua superficialidade midiática.
“Frágil ou o sentido da ruptura” tem uma porrada de personagens inquietos, delicados, solitários, esperançosos, revoltados e sonhadores arranhando o muro lá de casa. Cada cena do espetáculo traz similaridades e correspondências daquela angústia de qualquer ser humano que é deslocado de uma realidade para outra. Com a intenção de mostrar as consequências (boas e ruins) da ruptura, Edson Clair abriu-me um novo universo de admiração e busca, no qual o street dance, a poética videográfica e a fusão de rituais indígenas com elementos da urbanidade produziram um território único para sensações e pensares, oportunizando uma sensibilização e reflexão significativas. Oswald de Andrade dançou no túmulo quando o espetáculo foi concebido. Vi em cena um movimento antropofágico que colocou em dúvida a definição do que é a cultura do outro, porque o outro somos nós.
Não raro a gente sente um nó na garganta e “Frágil” incomoda, porque invoca a natureza humana que não é só bonita e inspiradora, mas também brutal, que exclui, pressiona, não compreende e julga. Felizmente a ruptura só faz sentido porque não pega de surpresa apenas os fracos, mas esbarra também nos fortes. E é com esses fortes que o espetáculo termina, pois é com o sorriso dos sobreviventes que a vida continua. “Frágil ou o sentido da ruptura” está aí para mostrar que apesar dos motivos que impelem esses jovens seres humanos a desistir, há muito mais pelo que (sobre)viver.
Quando presencio o trabalho do Edson Clair sinto que a vida está acontecendo exatamente onde eu estou. Mas e aí? Vamos receber goela abaixo o que o Funk-se apresentou e depois apertar a descarga ou estamos dispostos a discutir o destino dessas pulsões juvenis?

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